Crescente

on domingo, 31 de maio de 2009

Prêmio Cora Coralina 2009
O regulamento tinha um diferencial: O tema era livre, entretanto, era necessário associar ao texto referências dos homenageados da 9ª Feira Nacional do livro de Ribeirão Preto, no caso: Chile, Amazonas, Cora Coralina e Galeno Amorim. 

  
Crescente
 
Camila vinha apressada esticando o pescoço pra lá e pra cá. Ao dobrar a esquina, chamou a irmã para também ver o que ela sempre via. Começou a juntar gente, afinal, todos ficaram curiosos para avistar o que a garota saltitante e cheia de energia enxergava de tão espetacular lá no alto.

- A lua sempre sorri para mim! Podem ver, podem ver!

Ninguém ouvia a garotinha. Bastou um dedo apontando o céu e a multidão aglomerada começou a tecer visões de fogos de artifícios fora de época a rabo de cometa. Virgem Maria, seria disco voador? E surgiam notícias de aparições sagradas a objetos não identificados. Em meio à tanta gente curiosa, a jovenzinha ouviu mais uma versão e precisou saber o que é eclipse. A irmã, ainda zonza com tamanho alarde, examinava o céu buscando clareza para dar tais respostas.

_ Eita menininha perguntadeira! Pois então, a lua mordida é meia-lua. À meia-noite, escura, é eclipse. Vai ver, o eclipse é você comendo a lua com os seus olhos grandes, iluminados, encantadores, mordendo, devorando a face da lua.

A curiosidade da criança não tinha limites, pois, ela nem sabia o que era face, tampouco que a lua tinha uma. A irmã, ainda intrigada a procurar na alva lua um sorriso branco, buscava soluções à altura da imaginação da menina, que tinha asas.

- “Há muitos anos, havia na selva amazônica dois noivos apaixonados que sonhavam ser um casal. Ela vestia-se de prata e seu nome era Lua. Ele vestia-se de ouro e o seu nome era Sol. Lua era a dona da noite e Sol era dono do dia”.

- E eles se casaram?

- Não! O mundo acabaria!

Para a cabecinha sonhadora da garota, a lenda ecoou como um fato de efeitos catastróficos. Olhando para o céu, ela não conseguia mais ver as estrelas, muito menos entender como a lua ainda sorria. Ela sempre soube que o amor era uma coisa boa, e, de repente, amar poderia acabar com o mundo inteirinho! 

Ela amava a irmã, a mãe, o pai, o seu anjo da guarda, tanta gente! A menina que gostava de brincar de heroína e desejava ser uma garota super poderosa para salvar o planeta, sentiu medo do gigantesco amor. Tentando achar uma explicação, pensou em sua mãe e seu pai, que mesmo dormindo separados, ainda sorriam, pelo menos nas noites de Natal, quando o pai vestia aquela roupa desengonçada e fingia ser o verdadeiro papai noel.

Lembrou-se do menino mais bonito da escola inteira, que fazia ela sentir um frio da barriga até a espinha ou da espinha até a barriga, não importa, exceto que aquilo poderia ser amor e acabar com tudo. Se prata e ouro juntos vestiam tia Lucinha de mulher mais feliz do mundo nos carnavais, talvez o grande segredo para evitar o fim do mundo fosse ficar solteirona como a titia!

Perdida em seus devaneios infantis e em fragmentos de coisas que ouvia dos adultos, quanto mais reflexão, mais sofrimento, até começar a soluçar e, finalmente, daqueles ingênuos olhos negros verterem lágrimas suficientes para encher um Rio Amazonas.

A irmã, já desesperada, pegou a menina pela mão e, correndo para casa, tratava de compreender e consolar a pobre. Claro que a lua sorri para Camilinha, quem não sorriria? Até São Jorge, espada e dragão sorriem para essa criatura! Então, se “a vida tem duas faces, positiva e negativa”, “saber viver é a grande sabedoria”. E essa garotinha tem como destaque de suas habilidades encontrar-se sempre com o lado mais bonito de tudo. O que teria atingido as suas asas?

A criança foi minguando até constatarem uma febre que nem galeno curaria. Noite adentro, noite tão intensa quanto à luminosidade do luar, noite afora, sol nascendo e nada de a pequena melhorar. Foi quando alguém pensou em  perguntar o que a perturbava de fato. Imediatamente, surgiu o remédio milagroso.

Passaram do leito à sala e, numa improvisada reunião familiar, assistiram juntos a uns antigos slides da lua-de-mel de papai e mamãe. Entre lembranças encaixotadas em poeira esquecida, a pequenina descobriu o mundo, ao menos o dela. Num país não tão distante, num lugar chamado Vale da Lua, em pleno coração do deserto, começou a sua família e nem por isso foi o fim dos tempos.

2 comentários:

Rumquatronove disse...

Luciana,é raro ver por aí,essa filosofia poética ou, tanta poesia filosófica em breve texto,excluindo-se,claro,os "longos curtos" poemas do T.S.Eliot.No seu argumento,ví,por entre teus parágrafos,coisas que vc ñ quis dizer ou ñ quis mostrar...e quem sabe até,preferiu tudo resumido;mas,o que seria do leitor se tudo já estivesse na cara dele,né mesmo? Segredos sempre serão poemas... Seu belo texto,amarra neurônios desavisados.E,por falar em "cordas", o citado "Vale da Lua",por acaso,seria o mesmo lugar que eu conheço,em Alto Paraíso,GO?
Um abraço,e 3.075rsrs!

Anônimo disse...

Ah! O Vale da Lua fica no Chile e fazia parte do regulamento amarrar o conto ao Chile, Amazonas, Cora Coralina e Galeno Amorim. Daí, eu acho que lua, lua, lua foi ficando muito repetitivo. Fiz essa confusão aí e deu no que deu. rsrsrsrrs. Beijos e obrigada.

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