Miss Rose

on segunda-feira, 7 de junho de 2010

Hoje eu acordei com uma vontade danada de fazer uma grande festa. Motivo eu tenho, afinal de contas, faz um ano que estou limpa. Mas que festa seria essa sem brindes, sem luzes, sem orquestra, sem convidados! Agora lembrei que afastei o esplendor da minha vida em troca de alguns goles, de muitos porres que me anularam.               
                                                                                                 
Só me resta um encontro com recordações daquele tempo remoto que eu tinha controle. A saudade empoeirada guardada em uma gaveta secreta, numa caixa velha, esquecida em algum lugar na confusão dos meus sentimentos. Mas basta olhar as fotografias que elas se renovam. Por mais que sejam em preto e branco, a vida fica mais colorida quando se tem boas lembranças. Nostalgia não me causa melancolia. Só me traz a certeza de que um dia, num passado distante, eu fui feliz, apesar de tudo. A foto de quando fui miss na minha cidade me faz lembrar que sou uma mulher.  

O que me causa melancolia é o presente. É quando percebo que ainda sou mulher, porém, esquecida de mim mesma, das minhas vaidades, dos meus desejos. Perdi o viço, o brilho nos olhos, o frescor da minha pele. A beleza também é remota! Ainda remexendo a velha caixa de imagens preto e branco amareladas, sinto falta de uma do meu marido e outra dos meus filhos brincando no jardim. Deve ser porque não os tive. 

Ainda não encontrei uma explicação plausível para o que fiz da minha vida e tampouco consigo fazer planos. Se eu tento olhar para frente tudo o que consigo ver é uma velha solitária olhando para trás. Se o presente é melancólico, o futuro é desesperançado, desesperador, despedaçado pelo meu penúltimo passado. Dessa maneira, não vejo o porquê de uma festa sem brindes, sem néons, sem música. Estou farta de lutar por uma existência que só existe na minha memória. Não consigo mais conviver com a ex-miss do espelho. Sou digna; de dó. Danem-se os convidados! Antes só do que nunca. 

Hoje eu estou meio down, meio blues. Quero ficar sozinha para ir me acostumando com a solidão que assombrará o meu porvir. Para comemorar um ano de ex-vida nova e o início da minha nova velha vida sem sentido, serve qualquer bar que sirva bourbon e ecoe doze compassos que tocam na alma, que ferem, que doem. A minha velha vida de risos falsos pelo menos tem risos, tem som, tem cheiro, tem movimento. 

Pois encosto-me ao balcão, acendo um cigarro e peço um bourbon, por que não? Mas prestes a virar o primeiro gole, ouço o acorde do bluesman. Ele mal pisa no palco e eu acordo entorpecida sem ao menos encostar na boca o copo. Ele me come com os olhos e eu quase consigo tocar com as minhas próprias mãos aquelas fotos que ainda não existem. Sem perceber, estou na frente do palco cantarolando, me sentindo mulher novamente.

Miss Rose acompanha Blind Nelson

3 comentários:

Vanda disse...

Gostei da forma como foi escrito o texto, nos leva a pensar...Uma boa leitura!!
Beijos no coração!

Anônimo disse...

Muito bom texto,devemos guardar os bons momentos concordo os bons não nos fazem sofrer,solidão nem sempre,a vida continua.
abçs.

Jackie Freitas disse...

Lú, querida!
Vou ler o outro texto e aí comento direitinho...rs...mas já adianto que adorei!
Grande beijo,
Jackie

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